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quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

O carioca e a sujeira




ZUENIR VENTURA
A imagem daquele mar de lixo em Copacabana depois do réveillon deu razão ao prefeito Eduardo Paes, quando chamou de "porco" quem transforma as ruas e as praias em lixeira. Na ocasião, houve protestos contra as declarações, mas que outra classificação merecem as pessoas que em uma noite foram capazes de produzir ali 370 toneladas de entulho, do total de 645 recolhidas em toda a cidade, um terço a mais do que no ano passado? Outros bairros também se destacaram: Ipanema e Leblon, com 52 toneladas; Recreio, com 30; Flamengo, com 20 e, num último honroso lugar, o Piscinão de Ramos, com apenas 7 toneladas. Adriana Calcanhotto disse em música que "cariocas são bacanas", "são sacanas", "são dourados", "são modernos", "são espertos" e "não gostam de sinal fechado".

Faltou dizer que gostam de sujeira — não a corporal, mas a pública. Pessoalmente são asseados, tomam banho todo dia (e criticam os franceses por achar que eles não têm esse hábito), mas fazem do Rio uma das cidades mais sujas do mundo. Mantêm, por exemplo, o interior de seu carro impecavelmente limpo, mas lançam pela janela latas de refrigerante, garrafas plásticas, cascas de banana, jornal. Repreendem a faxineira que não limpou direito a poeira dos móveis, mas levam o cachorro para fazer cocô na calçada.

Outro dia, assisti a uma cena típica. Uma senhora jogou um pacote com porcaria no trecho que um gari acabara de varrer, e ele reclamou timidamente: "Acabei de limpar, e a senhora suja!" Resposta da ilustre dama: "Você ganha pra isso, e quem paga sou eu." Graças a essa mentalidade incivilizada de que, se pago imposto, posso emporcalhar a cidade, os números da imundície crescem cada vez mais. Cartazes no calçadão informam que só em Ipanema, "a cada hora, meia tonelada de lixo é abandonada na praia". No total, a cidade gera por dia quase 9 mil toneladas de resíduos, sendo que mais de 3 mil toneladas são de "lixo público" e 4.287 toneladas de "lixo domiciliar".

Uma das contradições do Rio é que se trata de um dos centros urbanos mais sujos, mas com um dos sistemas de limpeza mais eficientes. De fato, a Comlurb, "a maior organização da América Latina" no gênero, é um serviço exemplar, e poucos servidores públicos atraem tanto a simpatia da população quanto os garis. Não por acaso, Renato, o Gari sorriso que costuma roubar a cena no Sambódromo, dançando com a vassoura entre o desfile de uma e outra escola de samba, já foi eleito o Carioca Gente Boa e é uma celebridade. Aparece em comerciais ao lado de Gisele Bündchen e Zeca Pagodinho, conheceu a Europa e dá palestras motivacionais em grandes empresas. Uma de suas lições: "Se a população se conscientizar, não há necessidade de limpar uma rua três, quatro vezes por dia."

É o caso vergonhoso da Avenida Rio Branco, que é varrida seis vezes diariamente, de segunda a sexta.

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