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sexta-feira, 24 de março de 2017

Entrevista para o Programa Líderes Cariocas da Fundação João Goulart





IFJG: Conte-nos sobre a sua trajetória na PCRJ/COMLURB:

Gustavo Puppi: Entrei na PCRJ em 1995. Estava desempregado. O estaleiro em que eu trabalhava tinha falido e surgiu a oportunidade de fazer o concurso para a COMLURB. Como tudo do concurso tinha a ver com o que eu fazia no estaleiro, achei uma boa oportunidade.

Alguns meses depois, assumi a Gerência da Tijuca. Ainda trabalhando com muito pensamento da iniciativa privada, com o que eu vivia no estaleiro como metalúrgico, eu comecei a assumir responsabilidades que eram novidade para mim, porque eu não pensava em ficar muito tempo na COMLURB.

Ao assumir a Gerência da Tijuca, percebi que tinha que estudar para estar de fato e de direito na Prefeitura, pois a bagagem que eu tinha do estaleiro era importante, mas não era suficiente. O tempo foi passando e me tornei Gerente de Irajá, também trabalhando direto com o pessoal na operação.


Embora estivesse me aprimorando na área, conhecidos meus ainda insistiam para que eu voltasse para a iniciativa privada, recebia convites e tal. Eu, Gerente lá em Irajá, ia para as entrevistas, mas sem aquela pressão de ter que conseguir um emprego. A coisa mais hilária do mundo. Você vai relaxado. Numa entrevista eu fui recusado porque eles não iam conseguir pagar o que eu queria. Na verdade, como eu não queria nada, colocava a pretensão salarial lá em cima.

Eu entrei para a COMLURB quase sem querer, achando que ia ficar um ou dois anos e voltaria  para construção naval, mas, depois de assumir cargos, comecei a estudar coisas que tinham a ver com a administração pública e resíduos sólidos que me afastaram do meu universo anterior.

Durante o período em que fui Gerente, trabalhei na área operacional, cuidando de gari, Réveillon, Carnaval, shows. Enfim, todas aquelas coisas do dia-a-dia de rua. Porém, mesmo estando diretamente ligado à rotina operacional, fui estudando, me moldando, me modificando.

Como Gerente da Tijuca, fiz Pós-graduações em Administração Pública na FGV, a primeira oportunidade de estar com pessoas da Prefeitura, no contexto Prefeitura. Depois, como Gerente de Irajá, onde passei 9 anos, 11 meses e 5 dias, e não incorporei, fiz um curso no Instituto Brasileiro de Administração Municipal. Turma fechada aqui da COMLURB. Foi muito bom, porque foi um curso de Gestão de Resíduos Sólidos, do IBAM. Também fiz o curso de Engenharia Sanitária e Ambiental, na UFRJ. Aí “fechou o caixão”! Depois de estudar Administração Pública, Resíduos Sólidos e Engenharia Sanitária e Ambiental, esqueci como navio flutuava. Aí não teve jeito, virei comlurbiano e ponto final.

Em 2009, ainda fazendo a Pós-graduação na UFRJ, saí mais ou menos da parte de gerenciamento direto e virei Assessor Chefe da Diretoria Sul. Passei para uma parte mais de programação, do Planejamento e também de acompanhamento da parte operacional.

Foi nessa época que surgiu o “Programa de Líderes Cariocas”, que eu me inscrevi no último dia, na última hora, que eu soube que teria o Programa. Fiz a prova e passei. O curso da COPPEAD, acrescentando toda a experiência operacional e os cursos anteriores, me faz pensar, realmente, em ser executivo.


Uma filosofia que eu tenho: você sempre tem que agir na sua função, mas pensar como se você estivesse numa função acima. Então, por exemplo, o gari, tem que varrer, mas se imaginar como seria se ele fosse um encarregado. O encarregado tem que ser o melhor encarregado possível e sempre pensar no que faria se ele fosse gerente e assim por diante. Então, eu como Assessor que ficava direto com o Diretor, imaginava: se eu fosse Diretor, faria isso! Isso ajudava na assessoria e me ajudava, criando um laboratório. O que eu faria se fosse eu? Tinha uma visão de futuro.

Quando virei Diretor da Oeste, pensei: “Cheguei. Sou executivo”. É bom quando você chega e você ainda tem aquele sorrisinho, mas logo você vê que a responsabilidade aumenta mais do que esperava e volta tudo aquilo de montar equipe e começar um novo ciclo. Fiquei como Diretor na Oeste até assumir a Presidência da Companhia, em Janeiro/2017.

IFJG: O que é pra você gerir uma Companhia do tamanho da COMLURB?

Gustavo Puppi: É uma grande oportunidade porque não é uma empresa nova pra mim, mas traz uma responsabilidade enorme. “O Presidente agora é da casa, então ele vai resolver todos os nossos problemas.” Então quando você conversa com um gari (eu gosto de fazer isso, pois sendo operacional desde sempre, desde estaleiro, fuzileiro, eu gosto de estar junto do pessoal que está fazendo), você sente que eles estão pensando assim: “o cara vai fazer tudo”. E isso é uma responsabilidade enorme. É uma pressão adicional de então atender às expectativas.

Por enquanto está sendo um leãozinho todo dia. Mas isso é normal. Quando eu assumi Subgerência, quando assumi Gerência, Assessoria, Diretoria... No começo sempre foi assim: um leão. É claro que leões crescem um pouquinho. Os leões vão crescendo de tamanho junto com os cargos, mas é um leão a cada dia. Mas eu sei que o que acontece: com a rotina de você matar um leão por dia, você vai ficando resiliente com aquilo e chega um momento em que você domina a ponto de fazer melhorias significativas.

Eu sou o remador. Uma regata eu divido em quatro partes: largada, duas partes de percurso e a chegada. A largada é sempre a mais caótica. Todos os barcos estão juntos e é aquela confusão. Então eu estou numa largada. Estou usando a força, estou tenso. Quando chegar o percurso, onde desenvolve a velocidade com ritmo, é aí dará para fazer coisas muito boas.

Então é um desafio. Todo dia eu chego e: “Mamma mia!” e então termina o dia e no dia seguinte começa tudo de novo. Vou ganhando fôlego, musculatura, conhecimento. Vou ganhando jeito com a coisa e aos pouquinhos o leão vai amansando e vou começar a fazer o leão dar pirueta no picadeiro. Daqui a pouco, tudo estará 100% e vamos nadar de braçada.

Ainda vai melhorar muito, porque o pessoal daqui é bom. Eu digo, porque há 21 anos trabalho com eles. Do gari lá de Fazenda Botafogo ao Assessor, eu sei que todo mundo aqui é 100%. E acreditando na galera que você tem você nada de braçada. Daqui a pouco eu sou obsoleto.

IFJG: Por ser funcionário da Empresa e ter trabalhado na operação, você acha que fica mais fácil pra você, nesse momento, tomar algumas decisões?

Gustavo Puppi: Estava na hora, era o momento certo de ter na COMLURB um Presidente da COMLURB. Os presidentes anteriores eram executivos vindos de fora, que faziam o trabalho de gestão, mas que desconheciam o trabalho operacional. É o que eu falo para o pessoal, para os garis: Essa é uma oportunidade. Por ser da casa, há 20 anos na empresa, eu não tenho tempo de aprendizado. A pessoa que vem de fora precisa entender a dinâmica, entender a importância, entender quais são as coisas que acontecem de forma oficial ou por camaradagem. O dia-a-dia da empresa. Por não ter esse aprendizado, eu já começo jogando.

 
Esse ambiente de escritório, de sede, de finanças é ferramenta para garantir a boa operação. Eu não posso esquecer que eu sou operacional. Sou um executivo operacional. Ah! Eu sou o Presidente e mudei. Não! Eu não mudei. Sou peão. Até meu pai fala que eu nunca fiquei longe de peão. Não é agora que eu vou me afastar.

Tenho duas restrições fortes como presidente: a legal, não posso fazer nada fora da lei e a econômica. Eu tenho que ter dinheiro para fazer. Qualquer coisa que seja lícita e que tenha dinheiro para fazer, eu vou fazer. Isso é certo.

Então, coisas que eu sempre escutei o gari falando “se tivesse isso ou aquilo, se pudesse fazer isso ou aquilo”, de tanto escutar, agora eu já consigo, administrativamente, por estar na posição de Presidente quebrar certos dogmas, certas barreiras, certas culturas que existiam e que dá vencer.

Por exemplo, as pessoas reclamavam muito da Avaliação de Desempenho, então estamos reformulando essa avaliação. Falavam muito que tinha que existir oportunidade para gari com nível superior. Como progressão, dando preferência para gari com nível superior. Estamos reformulando o plano de carreira. Estudando sobre um novo uniforme... então têm várias coisas que a gente já está buscando fazer.

Outra coisa que gosto de fazer também é passear pelo “Convés”. Fico andando pelas baias. Nenhum presidente fez isso. Converso com um, com outro. Vou nos outros andares. Brinco com um, brinco com outro. Se preciso de algum relatório, não vou pedir por telefone. Vou lá na mesa do cara, sento e converso uns 10 minutos, falando o que quero e o que não quero. Tão mais fácil! O produto que vem, é o produto que se quer. Porque você foi lá cara a cara. Passeando no convés, as pessoas te reconhecem. Conversa e sorriso não tem listado no orçamento, pode-se usar à vontade. E isso dá retorno. Só de você dar um bom-dia para as pessoas, você já fez a diferença no dia delas.

IFJG: E o que você entende que sejam os principais desafios da COMLURB para esse ano e para essa nova gestão?

Gustavo Puppi: A conjuntura econômica. Manter o nível de serviço, com menos recursos. Está ruim para todo mundo. Não é problema só da COMLURB. É de todos os Órgãos, de todas as esferas. É um problema econômico forte e os gestores tem que lidar com isso. Às vezes você quer fazer e não consegue. Às vezes você faz e tem que reduzir porque realmente não tem orçamento. A restrição que tenho é a legal e a econômica.

IFJG: Quando você sair da presidência da COMLURB, o que pretende deixar de legado?

Gustavo Puppi: O legado que eu quero deixar, quando eu sair da Presidência é uma COMLURB viva, uma COMLURB forte. COMLURB da COMLURB. E quando eu estiver sentado numa baia aqui ou gerenciando, as pessoas possam dizer que o Gustavo fez um bom trabalho. Quando eu estiver, de novo, fora do ambiente executivo, no ambiente de operação, como gerente, como encarregado, ou o que for, que eu consegui contribuir da melhor forma possível.

IFJG: Você falou que o Programa Líderes Cariocas fez você perceber que poderia ser um executivo. Além disso, você acha que o PLC colaborou de alguma forma para que você chegasse a essa posição?

Gustavo Puppi: Ajudou-me totalmente. O Programa me forneceu uma base de conhecimento além do meu dia-a-dia operacional, me deu ferramentas para acreditar que eu conseguia. Fez-me sentir pertencente à Prefeitura, me deu visibilidade. Essa interação que a gente teve com seminários, com cursos, essa coisa de ser Prefeitura, ajudou e ajuda muito. Dá pra entender a PCRJ e a gestão como um todo.

Na renovação do Líder Carioca, você tinha que dar um objetivo para poder renovar. Eu fui para a banca de renovação dizendo que o meu objetivo era ser o primeiro presidente da COMLURB de dentro da COMLURB. Então, o programa te dá uma meta, um fio condutor pra você conseguir sair do Ponto A e chegar ao Ponto B.


Agora, não é só isso. Não é chegar no “Líderes Cariocas” e achar que só por causa disso você vai ser chefe geral. Não basta! O “Líderes Cariocas” só te dá o instrumento, dá visibilidade, melhora a sua autoestima, mas quem faz é você. Não é o Programa. Você tem que fazer por onde. Não é o PLC que promove. É você que se promove.

IFJG: O que você deixaria de mensagem para outros Líderes?

Gustavo Puppi: Não espere ter o cargo para você ser Líder. Seja Líder antes do cargo!


Você tem sempre que pensar pra cima e ajudar pra baixo. Se você não tiver um substituto, se você não tiver uma equipe que consiga levar na sua ausência, você fica amarrado ali. Então tem que ser assim: eu tenho que ser obsoleto no meu lugar. O verdadeiro Líder tem que criar condições para que a coisa funcione de uma forma que ele seja quase que expurgado daquele nível para o próximo nível. As pessoas dizem: vou ser importante no lugar que eu estou! Se você for importante demais no lugar que está, você continuará no lugar que está. Agora, se você chegar e criar todas as condições para a coisa funcionar de forma que independa de você é a forma que você tem de subir. E quando você subir, o cara lá embaixo foi treinado e já sabe o que tem que fazer no seu lugar. Mas você tem sempre que pensar em cima e olhar para baixo.


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