Autor: Claudio
de Moura Castro
Veja - 25/06/2012
Morreu Steve Jobs, homem
arrogante, obsessivo e briguento. Comportava-se como se as regras fossem apenas
para os outros. Há quase um século, morreu F.W. Taylor, de desgosto, após haver
sido humilhado no Congresso americano por sindicalistas agressivos. Era
também arrogante, obsessivo e briguento. Lembremo-nos dos conselhos de Peter
Drucker: julguemos as pessoas mais pelas
suas qualidades do que pelos seus defeitos. E assim foi com Jobs. Além de
outras proezas, todos reconheceram que criou os computadores pessoais
para pobres e ricos, transformando-os na ferramenta mais universal que jamais
existiu. Contudo, na Terra Brasilis, Taylor não encontrou a sua redenção. A
cada ano, é crucificado por professores dos cursos introdutórios de
administração de empresas. Como se não bastasse, mostram o filme Tempos
Modernos, de Charlie Chaplin, com sua versão grotesca das linhas de montagem.
Hoje, "racionalização do trabalho" é assunto maldito. Mas submeto aos
leitores a tese de que ninguém fez tanto pela produtividade da indústria.
E sem organizar o trabalho, não há produtividade. E, sem isso, não há qualidade de vida para os mais pobres.
Essa foi a revolução que Taylor iniciou e obstinadamente defendeu durante toda
a sua vida.
Taylor travou, a ferro e fogo,
algumas batalhas desnecessárias ou erradas, daí a birra dos sindicalistas. Mas
sua mensagem principal em nada envelheceu: em primeiro lugar, é preciso estudar
cientificamente o trabalho, como um objeto de pesquisa séria. Em segundo lugar,
é preciso redesenhar as máquinas e os processos de trabalho, para a dimensão
humana. Em terceiro lugar, é preciso
preparar as pessoas para usar as máquinas da forma mais eficiente que se
conhece. Essa foi a sua revolução. Tive uma oportunidade curiosa de brincar com
as suas ideias. Ao terminar o meu mestrado, passei dez dias lavando
pratos para os remadores de Yale - que se preparavam para a regata com
Harvard. Eu e outro recém-graduado compartilhávamos 700 pratos sujos por dia.
Estudei detalhadamente os movimentos de mão e o conjunto dos gestos. Comecei a
experimentar. Inicialmente, aumentou o tempo de lavagem, comparado ao do meu
colega. Mas no décimo dia eu já levava metade do tempo. Em um mundo hipotético,
seria duas vezes mais rico do que ele. Para mim, foi uma boa educação, mas nada
prova para o mundo. Contudo, o descaso no Brasil com o processo de trabalho
parece descomunal. Simplesmente, desistimos de fazer o que propôs Taylor, antes
de avançarmos o suficiente, exceto em certos processos, em indústrias grandes.
Onde quer que olhemos, a ferramenta é errada, o operário não sabe usá-la,
o fluxo de trabalho é truncado, e há outros equívocos. Perde-se, pelo mau uso,
um terço do material usado na construção civil. Ou seja, os operários não
aprenderam a aplicar processos mais eficientes, como ensina o taylorismo.
Ao encomendar uma peça em uma
madeireira, há boa probabilidade de que o desengrosso esteja com as navalhas
cegas ou o operário não saiba ajustar a máquina. Como a luz da oficina é
insuficiente, pode também vir daí o erro. Aliás, posição errada dos pés ao
operar uma serra circular pode causar desequilíbrio e lá se vai o dedo. Na
verdade entre a árvore e o uso final, a perda de madeira é da ordem de 90%. Se
Taylor fosse vivo, ficaria ainda mais escandalizado com a trajetória tortuosa e
idiota dos papéis em uma burocracia. Mesmo se hospedando pela décima vez no
mesmo hotel, o hóspede deve preencher a mesma ficha boboca, com informações que
jamais serão usadas. Eu quis comprar uma garrafa de vinho, mas, sem "fazer
o cadastro", a compra só foi possível com a autorização do gerente. Ao
cobrar algo, diante do computador, o atendente preenche um formulário com
papel-carbono.
Por que fazer um requerimento ao
governo? Se paguei a taxa, é porque quero o serviço ou o papel. Por que não
pagar Darf com cartão de crédito (e, quem sabe, reduzir a corrupção)? Na fila
do correio, posso ver que o processo de trabalho jamais foi pensado com as
ideias de Taylor. Os tempos são modernos. Todavia, diante da nossa pífia
produtividade, nem tão modernos assim. Sugiro aos nossos doutos professores
que, antes de criticar o taylorismo, esperem que ele chegue ao Brasil. Onde ele falta faz!
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