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quinta-feira, 4 de setembro de 2025

Do compliance à estratégia: como o ESG redefine a gestão de riscos nas empresa

A intensificação dos riscos climáticos no cenário global impõe às empresas a necessidade de revisar suas práticas de gestão e incorporar, de forma estruturada e transparente, critérios ambientais, sociais e de governança (ESG) à sua estratégia corporativa. Mais do que uma exigência reputacional ou regulatória, trata-se de uma abordagem fundamental para fortalecer a resiliência organizacional, proteger a reputação e preservar o valor econômico de longo prazo.

Nos últimos anos, eventos extremos (enchentes, secas prolongadas, queimadas, ondas de calor ou frio intensas, crises hídricas e energéticas, etc.) têm se tornado mais frequentes e intensos. No Brasil, episódios recentes de desastres ambientais mostraram como falhas na antecipação e na gestão de riscos podem gerar prejuízos financeiros e comprometer a continuidade dos negócios. Nesse contexto, o gerenciamento ativo de indicadores ESG surge como ponto central na mitigação de riscos e na identificação de oportunidades associadas à transição para negócios mais sustentáveis.

A adoção de métricas e práticas alinhadas a ferramentas internacionalmente reconhecidas — como as recomendações do TCFD (Task Force on Climate-Related Financial Disclosures), os padrões setoriais do SASB (Sustainability Accounting Standards Board) e as diretrizes emitidas pelo recém-estabelecido ISSB (International Sustainability Standards Board) — permite às organizações estruturarem processos robustos de divulgação, monitoramento e resposta aos impactos materiais relacionados ao clima e a outros fatores ESG.

A metodologia do TCFD foca na divulgação de ameaças e oportunidades relacionadas ao clima, com ênfase em quatro pilares: governança, estratégia, gestão de riscos e métricas e metas. Sua aplicação amplia a transparência e oferece aos investidores informações consistentes para avaliação de riscos climáticos.

O arcabouço do ISSB, órgão vinculado à IFRS Foundation e voltado ao mercado de capitais, busca consolidar padrões globais de sustentabilidade, com foco na materialidade financeira e na interoperabilidade com outros instrumentos. Ao equilibrar conceitos e indicadores, o ISSB reduz a fragmentação das informações e facilita a comparabilidade entre empresas de diferentes setores e países.

Já o SASB fornece padrões setoriais específicos, amplamente utilizados por investidores institucionais para avaliação de desempenho ESG, com foco em aspectos materiais que impactam diretamente a performance financeira. Essa abordagem orienta as empresas a reportarem dados relevantes para seu setor, aumentando a utilidade das informações divulgadas.

Integrar essas ferramentas aos relatórios financeiros e contábeis representa um avanço significativo na gestão dos negócios. As informações obtidas expandem a visão dos gestores sobre os fatores que impactam a sustentabilidade da empresa e permitem decisões mais embasadas, antecipação de crises e fortalecimento da confiança de acionistas e de outros públicos. A clareza sobre os riscos não financeiros que podem comprometer o retorno de investimentos é cada vez mais valorizada pelo mercado.

Esses dados, quando incorporados às práticas de compliance, auditoria e controles internos, tornam-se aliados estratégicos da governança corporativa. Em um ambiente em que riscos podem se transformar em crises em questão de horas, antecipar, mensurar e reportar impactos ESG pode ser o fator decisivo entre a sustentabilidade e o fracasso do negócio.

A implementação efetiva dessa agenda exige que a alta liderança esteja engajada e que haja integração entre as diferentes áreas da companhia. Além disso, a tecnologia desempenha um papel essencial, permitindo o uso de sistemas de monitoramento em tempo real, inteligência de dados e modelos preditivos para antecipar riscos climáticos e sociais.

O movimento regulatório também acelera essa transformação. No Brasil, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), por exemplo, já avança na direção de exigir divulgações alinhadas ao ISSB. No exterior, normas como a CSRD (Corporate Sustainability Reporting Directive), da União Europeia, e a regra de divulgação climática da SEC (Securities and Exchange Commission), nos Estados Unidos, reforçam que a transparência sobre riscos ESG será, em breve, um requisito inegociável para empresas que pretendem acessar capital global.

Em vez de enxergar o ESG como custo ou imposição regulatória, é hora de compreendê-lo como diferencial competitivo. Empresas que adotam estruturas sólidas de gestão de riscos com base nesses critérios fortalecem sua capacidade de adaptação, aumentam sua atratividade junto a investidores e clientes e se posicionam melhor em mercados cada vez mais atentos à sustentabilidade.

O futuro das organizações será moldado pela capacidade de identificar, compreender e responder aos riscos e oportunidades ESG. As companhias que se anteciparem, investirem em governança e integrarem sustentabilidade à estratégia estarão mais preparadas para prosperar em um mundo de mudanças rápidas e incertezas crescentes.


Sergio Volk é membro do Conselho Fiscal do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças de São Paulo (IBEF-SP), além de membro do Conselho Consultivo da Cogni ESG e professor no MBA da FEI. É economista, cursou doutorado em economia pela EPGE-FGV/RJ, e mestre pela PUC-SP em Contabilidade, Finanças e Auditoria. 

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